Espírito crítico

"Sem liberdade de criticar, não existe elogio sincero. "
(Pierre Beaumarchais)

"Quem se enfada pelas críticas, reconhece que as tenha merecido."
(Tácito)

"Onde não se pode criticar, todos os elogios são suspeitos."
(Ayaan Hirsi Ali)


"Só tem o direito de criticar aquele que pretende ajudar."
(Abraham Lincoln)

domingo, 13 de abril de 2008

Uma batalha apenas


Na madrugada do dia 12 de Abril, conseguimos uma vitória, mas foi apenas numa batalha. Mais de cem mil vozes começaram a ser ouvidas. Valeu a pena deixarmos de corrigir os testes e afastarmo-nos da família por um dia para nos juntarmos e mostrarmos que nos sentíamos indignados por sermos tão maltratados pelo Ministério.
Inicialmente, todos os professores tinham de ser avaliados ainda este ano em duas aulas assistidas. Depois, já não havia aulas assistidas, porque os titulares não teriam tempo de dar as suas aulas e de assistir às dos “colegas” avaliados. Depois eram só os contratados e os que mudavam de escalão a serem avaliados, segundo os critérios de cada escola. Finalmente, esses professores serão avaliados pelos mesmos indicadores em todo o país. Analisando esses critérios, concluímos que são os mesmos que já existiam e que este governo suspendeu, porque congelou o tempo de serviço e as carreiras. É verdade, quem suspendeu a avaliação dos professores para depois dizer que não existia foi este governo.
No entanto, só vencemos uma batalha que só terá reflexo neste ano lectivo, ainda há um longo caminho a percorrer, pois ainda temos de conseguir ganhar a guerra das mudanças para o futuro, negociando os seguintes pontos:
1.º Acabar com a distinção das categorias na carreira;
2.º Repor a democracia nas escolas;
3.º Impedir que o abandono escolar conte para a avaliação dos professores;
4.º Aproveitar o acordo para impor este modelo de avaliação simplificada e menos burocrática a todos os professores nos próximos anos;
5.º Voltar a ser concedido tempo aos professores para planificarem e prepararem aulas, elaborarem e corrigirem testes, fazerem relatórios e prepararem actividades, analisarem e seleccionarem manuais, participarem em reuniões e fazerem formação;
6.º A supervisão de aulas deverá ser só em casos pontuais;
7.º Os resultados da avaliação dos alunos não devem influenciar negativamente a avaliação dos professores, porque a “matéria-prima” não é idêntica;
8.º A diminuição do número máximo de alunos por turma para 25, numa primeira fase;
9.º A devolução do tempo de serviço efectivamente prestado para efeitos de progressão na carreira;
10.º O mesmo tratamento para correctores de exames nacionais do 3º ciclo e do secundário;
11.º A distinção clara no Estatuto do Aluno entre faltas justificadas e injustificadas.
Se conseguirmos acordo em 6 destes 10 pontos já será uma negociação positiva. Caso contrário, o ministério vencerá. Para conseguirmos uma vitória clara, temos de explicar bem aos portugueses que o passo dado foi só para este ano lectivo e que a luta continuará para que o modelo, que o ministério e sindicatos concordaram que era justo para os contratados seja adoptado para todos os docentes, nos próximos anos. O Ministério foi ardiloso ao fazer o acordo só para este ano, acabando com a contestação, porque a partir de agora a opinião pública não perceberá os motivos que levarão os professores a continuar a lutar, se o ministério já cedeu. Devemos aproveitar esta vitória como motivação para as futuras lutas e explicar muito bem a todos que o entendimento alcançado foi só para este ano lectivo.
Neste jogo de xadrez, temos de nos lembrar de que ainda só conseguimos pôr o rei em xeque, de que este jogo só se ganha com xeque-mate e de que o adversário fez uma boa jogada para o evitar, lançando-nos o isco... Cabe-nos fazer a próxima jogada.
salvarescola@gmail.com

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Escola (In)Segura

Eu nem queria acreditar quando ouvi a senhora ministra da educação dizer que não era preocupante terem sido detectados "apenas" 140 alunos com armas, durante o ano lectivo anterior. Certamente, para a senhora ministra, admito que não seja preocupante, porque não deve ter filhos em escolas públicas e porque pode levar seguranças, quando vai visitar escolas. No entanto, para os pais que ouvem que há colegas dos seus filhos armados nas escolas, não é nada tranquilizador. Já não falo dos professores que têm de os enfrentar, porque há muita gente que não dá importância aos docentes e, por isso, nem a senhora ministra nem alguns comentadores se preocuparão que alguns sejam exterminados.
Há algum tempo atrás, um responsável da polícia disse que só são apreendidas 10% das armas e da droga que circulam no país e que, quando aumenta o n.º de apreensões, significa que a quantidade que circula é maior. Portanto, deve haver dez vezes mais de armas nas escolas portuguesas, nas mãos de adolescentes, que por definição são instáveis e muitas vezes irresponsáveis.
Ao longo da minha carreira, eu já tive dois alunos que foram apanhados com armas. Um foi apanhado com uma arma de fogo e outro com uma faca ponto-e-mola. Foram encaminhados para o tribunal de menores e o "castigo" foi o de continuarem a frequentar a escola para que os pais não perdessem o rendimento mínimo.
Já que o senhor Primeiro-Ministro não tem coragem para demitir a ministra pelo menos mantenha-a calada.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Barcos à deriva

O Ministério da Educação, obcecado com o sucesso fictício dos resultados dos alunos, para o qual a avaliação do desempenho dos professores e o novo estatuto do aluno são dois instrumentos, esqueceu-se de resolver os problemas da escola.
Como eu sou coordenador do grupo disciplinar de Língua Portuguesa da minha escola, alguns colegas perguntaram-me como iríamos ensinar os alunos a escrever depois da assinatura do novo acordo ortográfico: passávamos a seguir o novo ou ensinávamos como até aqui? Se estamos a preparar alunos para o futuro, fará sentido continuar a utilizar a ortografia antiga?
Os manuais de Língua Portuguesa estão desactualizadíssimos, porque a adopção de novos manuais está suspensa há alguns anos, devido ao disparate que foi a TLEBS (Terminologia Linguística dos Ensinos Básico e Secundário), imposta em todo o país sem discussão e suspensa por ser tão confusa e ambígua como o novo modelo de avaliação dos professores. Na minha opinião, os erros da TLEBS deveram-se à tentativa de copiar e adaptar à Língua Portuguesa as gramáticas das línguas germânicas, esquecendo ou querendo apagar as nossas raízes latinas. Assim, no 7.º ano os alunos têm um manual de Língua Portuguesa com a nova terminologia linguística, mas esses alunos, quando chegam ao 8.º e ao 9.º, têm manuais com a antiga terminologia.
Em relação ao novo acordo ortográfico, ainda não chegaram instruções aos professores, por isso cada um vai ensinar conforme a sua consciência o indicar. O problema vai reflectir-se nos exames ou talvez não: os professores correctores vão receber indicações do GAVE para aceitarem as duas ortografias, tal como o fazem actualmente para as duas terminologias.
O Ministério não sabe que indicações dar. As decisões estão a ser tomadas em cima do joelho e corrigidas no dia seguinte. Todos os dias chega legislação às escolas que contraria a do dia anterior. Ora é necessário rever o Regulamento Interno à pressa, ora temos até ao final do ano; ora há avaliação para todos, ora não há; ora temos de definir objectivos individuais para este ano, ora será só para o ano. Mas o que é isto, meus senhores? Que barco é este que tem um destino, mas ninguém sabe como lá chegar? Até há pessoas que nada entendem do que se passa actualmente no mar das escolas que já querem dar sugestões de como comandar as embarcações (turmas) superlotadas. Nós queremos ensinar e conduzir o barco a bom porto, mas há uma tempestade de ventos contrários lançados pela comandante da armada que leva cada um para seu lado. Não tenho dúvidas de que todos naufragaremos numa sociedade sem valores, sem assiduidade, sem respeito e sem produtividade.
Vou dar um exemplo muito simples para que todos (mesmo a ministra) o entendam: se um dia eu chegasse a uma sala de aula e dissesse que "Maria" era um nome próprio; no dia seguinte, um adjectivo, depois, um verbo e, no final, reafirmasse que era um nome próprio, acham que algum aluno confiaria em mim?
Podemos também nós confiar neste Ministério e no que ele está a fazer ao nosso país?

Se confiam nesta ministra para gerir a educação dos vossos filhos, têm de confiar muito mais nos professores, que, apesar de não serem perfeitos, cometem menos erros.